23 agosto, 2010

Homenagem ao meu avô

É estranho, mas eu nunca pensei que ia acontecer;

Sabia, é verdade, pois ele já tinha 93, e a gente nasce mesmo com prazo de validade.

Mas não imaginava. Não imaginava conseguir viver sem a presença dele.

E sempre me doía só de pensar no dia que ele partisse...

E ele partiu. Foi embora do mundo que ele tanto adorava. Do mundo que ele soube aproveitar como poucos.


Meu avô é O cara da minha vida.

Não digo que é o pai que eu não tive, porque eu tenho um pai. Mas ele foi o meu pai DE VERDADE.

E ele me ensinou muito, muito mesmo. E mesmo nos últimos suspiros. No seu leito de morte. continuou me ensinando. Ensinando sobre o adeus.

Eu vi a vida saindo do corpo dele, devagarinho. doída. E isso me doeu e me ensinou sobre a morte.

E abraçar seu corpo, que era só um corpo porque ele já não tava mais lá, me ensinou de entender. Entender o incompreensível.

Daí eu fiquei com vontade de escrever aqui umas coisas que ele gostava de escrever. Porque ele não gostava de escrever. Meu avô gostava mesmo de lhar o céu. Ler sobre ciência. Então ele não era poeta, nem nada disso.
Mas quando ele falava das estrelas, e dos bichos, e das plantas, e de como funciona nosso corpo por dentro... ele fazia poesia pra mim. Fazia sim.

E uma vez ele me deu um papelzinho com umas frases escritas e pediu pra eu guardar. Não sei por que ele fez isso.
E outro dia também ele me deu outro papelzinho. E pediu pra eu guardar também. Não sei porque mesmo ele queria que eu guardasse esses papelzinhos...
Não sei se ele sabia tudo o que eu ia guardar dele, pra sempre. Não sei se eu contei pra ele. Não sei se contei de tudo que ele me deixou, e que sou eu mesma em parte.
Não sei se contei pra ele, mas agora, que ele se foi, sei que não me arrependo. Passei com ele todos os bons momentos, fiquei com ele sempre, e quase todos os dias. Não me arrependo e fico feliz de não me arrepender. Curti ele o quanto pude.

E ele me pediu pra guardar esse papelzinho, e eu não sei por que, até porque não tem nada demais escrito nele. São só umas frasesinhas...bem a cara dele. o título é Pensamentos

"A energia é a matéria em estado instável"

"A matéria é a energia em estado estável"

"O pensamento não é mais que uma forma de energia biológica"

"A morte não é mais que a perda de adaptação ao meio ambiente, adquirida atravez de milhões de anos."

"A mulher é qualquer coisa de eternamente variável."

"A paz é um desejo, a guerra uma realidade."

Lendo eu acho engraçado.
Ele sabia que a morte não era nada mais do que o corpo desligando. Ele sabia biologia demais pra imaginar outra coisa qualquer.
Fico com o peito apertado de pensar nisso, porque acho que ele deve ter sentido mais medo quando se viu próximo dela.
Mas ele era curioso também... talvez, por um momento, tenha imaginado que finalmente ia ver as estrelas mais de perto.

18 agosto, 2010

Você é prepotente
Não gosto do seu cheiro
Você é sem graça
Não gosto do seu jeito
Você me irrita
Você nem percebe
Não gosto da forma como você faz as coisas
Você é egoista, racista, insensível
Não gosto da sua conversa
Não gosto das suas pernas, nem das suas mãos
Você tira o meu humor
Você é medíocre
Te amo.

17 agosto, 2010

cobertor

"o despertador já tocou"

Mas tem o cobertor, e tem suas pernas trançadas na minha, e tem suas costas, e tem seu cheiro...

E tem também pedaços de medo, de dor, de ansiedade, de angústia...

Mas tem suas mãos, e tem o travesseiro, e tem o vento gelado lá fora e o beijo quente aqui dentro.

"Mais cinco minutinhos?"


16 agosto, 2010

segundos

Dá para saber o momento exato em que nos apaixonamos por alguém?

O exato momento em que seu corpo, sua mente, seus olhos param e ficam em suspensão. O momento exato que você pára de escutar, fica cego de tudo que está ao redor?

Os dias pareceriam confusos, se eles não estivessem claros e límpidos na minha memória.

não, não são bem os dias. são os segundos. É. são os segundos que estão claros. fecho os olhos e reconheço os segundos.

os segundos e os gestos nos segundos. os segundos e os olhares nos segundos. os segundos e cada pulsação nos segundos. os segundos e cada arrepio.

O toque que cortou a respiração.O som da voz. O sorriso. E o olhar definitivo. aquele olhar que não se tem mais volta.



Sim. Eu sei. Sabia, soube e sei. Soube e senti. Sei e recordo.





Mas se assim for, é possível nos apaixonarmos novamente pela mesma pessoa por quem somos apaixonados?



É possível de novo a suspensão? é possível perder de novo a respiração? sair de onde estamos? deixar de perceber a nossa volta?



E é possível novamente sentir o silêncio do momento? Sentir o segundo? O segundo do silêncio?

O segundo do aperto. O momento exato do arrepio, do pânico, e perceber esse momento claro e límpido?

12 agosto, 2010

culpa

hoje coloquei o despertador para tocar às nove da manhã.

coloquei a soneca para quinze minutos. 09:15h, para quinze minutos mais. 09:30h. e para quinze minutos mais. 09:45h

Aí eu entrei em um banho quente às dezprasdez da manha e por lá fiquei, deixando a água escorrer...
Aí eu tomei café preto daqueles muito cheirosos e comi mel. adoro mel.

Cheguei ao trabalho às onze da manhã e resolvi confessar a minha pontada de culpa.


Por que foi mesmo que chegamos nessa culpa?

11 agosto, 2010

sonhos sonhados e uma noite em claro

Meu avô está doente.

Não é doença de doença... é doença da vida indo embora. Aos pouquinhos...

Justo ele. Que me ensinou a viver.

Justo ele. Que me ensinou a gostar de tudo o mais que fosse vivo.
De formigas a cerejas... de laranjais a bezerros.

Justo ele. Que tinha tanta vida.
E sempre ganhava de mim no jogo de volei, mesmo com os 65 anos de diferença.


Ele tá no hospital. E tá triste.
Tá triste porque não quer deixar esse mundo, tanto quanto eu não quero que ele me deixe.

E é injusto alguém ter que deixar esse mundo sem querer. Não é?

Ou será que a validade vem impressa na gente... e todo mundo sabe muito bem até quando ela vai. Não adianta reclamar...


Sonhei com ele noite passada. Sonhei que jogávamos volei. Eu ele e minha avó;

A gente dava risada como antigamente.
Mas de repente ele se sentia mal. Aí eu ia pra perto dele e dizia que não era nada... ele ria, levantava e dava outro saque.
De vez em vez jogava um beijo pra minha avó... tipo namoradinho.

O sonho me perturbou muito.

Perturbou pela saudade. Perturbou porque eu sei que, por ele, ele jogava mais tantas partidas de volei.




E aí que tenho insônia.
Eu sei... mas acho que vai passar dia desses. Só ainda não sei como.

E tudo se misturou na minha cabeça que agora anda perturbada nem sei por que...
e essa noite vi o dia amanhecer de olhos abertos.




Fui ver um filme ontem.
A Origem,
Achei muito bom. Filme de ação complexo. cheio de referências...

O filme se passa dentro dos sonhos... dentro da cabeça de quem dorme, enquanto dorme.

Adoro sonhar. E sonho deliciosamente muito. Sonho em cores, com trilha sonora, e montagem onírica como convém.

Mas a insônia me priva de sonhar mais... e ela tá me perturbando agora talvez mais que antes. Só porque, justamente, tempos atrás eu achei que ela tinha cessado.

A questão é que saí meio zonza do filme.
Talvez por motivo nenhum, talvez pelo motivo em si.
E não dormi.

E passar o dia acordada depois de uma noite fritando deixa a gente com a percepção alterada. Sensível demais. Medrosa demais. Com fome demais. Distraída demais. Introspectiva demais.

Talvez bons atributos para quem queira dirigir um bom filme ou escrever um post.
Talvez não.

05 agosto, 2010